Voltar ao Primeiro Amor: por uma Pastoral da Re-Iniciação
Voltar ao Primeiro Amor: por uma Pastoral da Re-Iniciação Cristã
A Igreja, chamada a ser casa de portas sempre abertas, enfrenta o desafio de muitos batizados que, com o tempo, afastaram-se da vivência comunitária da fé. Afastamentos silenciosos, muitas vezes dolorosos, que não significam negação da fé, mas a ruptura de vínculos com a vida eclesial. Trata-se de um fenômeno crescente, marcado por experiências negativas, desencontros, mudanças de contexto, crises existenciais ou, simplesmente, esquecimento pastoral.
É nesse horizonte que se propõe a criação de uma Pastoral da Re-Iniciação Cristã: um caminho missionário, humano e espiritual, voltado a favorecer o reencontro de batizados afastados com a comunidade e, sobretudo, com o próprio Cristo. Mais do que um retorno administrativo ou ritual, a proposta é de uma nova iniciação, marcada pela liberdade interior, pela escuta respeitosa e pela redescoberta do amor que transforma.
Essa pastoral não se configura como mais uma estrutura dentro das muitas ações eclesiais existentes, mas como um apelo à conversão pastoral da Igreja. Um convite para pensar novos itinerários, capazes de acolher com ternura os que partiram, sem culpabilizá-los, mas oferecendo espaços concretos de escuta, cura, partilha e reinserção.
1. “Onde estás?” – A escuta que inicia o caminho
Inspirada na pergunta que Deus faz ao ser humano no Gênesis, essa pastoral deve começar pela escuta. Escutar é mais do que ouvir; é colocar-se na presença do outro com atenção, compaixão e abertura. Antes de qualquer catequese ou convite à prática sacramental, é necessário ouvir os motivos, os silêncios, os gritos abafados de quem, por diferentes razões, deixou a vida comunitária para trás.
Muitas dessas pessoas foram marcadas por experiências negativas no interior da própria Igreja: julgamentos, indiferença, exclusões. Outras, foram simplesmente esquecidas, sem que ninguém notasse sua ausência. Há ainda aquelas que, diante de dramas pessoais, buscaram apoio e não encontraram eco. A escuta, nesse contexto, não é apenas uma etapa do processo, mas sua base fundante.
É preciso criar espaços de escuta real e pastoral: grupos, encontros, visitas, acompanhamentos, onde o principal não seja falar da Igreja ou da doutrina, mas acolher a dor, a ausência e o desejo de recomeçar. Escutar como o Bom Pastor que reconhece a ovelha mesmo coberta de lama, como o Pai que espera e acolhe o filho que volta.
2. “Vinde e vede” – O reencontro com Cristo na comunidade
Não se pode propor um retorno à fé sem que a comunidade esteja preparada para acolher. O reencontro com Cristo se dá, quase sempre, através de rostos concretos: um grupo, um vizinho, um convite inesperado. Por isso, a proposta de uma Pastoral da Re-Iniciação Cristã passa também pela sensibilização das comunidades, que devem tornar-se verdadeiras casas de acolhida e testemunho.
É necessário formar pequenos núcleos de convivência, oração e partilha, onde a experiência da fé possa ser redescoberta de forma simples, bela e libertadora. Uma comunidade que acolhe sem perguntar “por que se afastou?”, mas que diz “estávamos esperando por você”, é já sinal do Reino de Deus.
Essa pastoral não tem como objetivo encher bancos ou estatísticas. Seu horizonte é evangélico: fazer do reencontro com Cristo uma experiência pessoal, profunda e transformadora. E isso só é possível quando a comunidade se apresenta como lugar de misericórdia, de fraternidade e de escuta.
3. “Permanecei no meu amor” – Perseverar no caminho da fé
A reaproximação não pode ser evento único. O desafio da continuidade é tão grande quanto o da acolhida inicial. Por isso, essa pastoral deve também prever formas de acompanhamento duradouro: itinerários de formação básica, inserção progressiva nos serviços comunitários, grupos de partilha de vida e fé.
O retorno à comunidade deve ser sustentado por vínculos reais, por relações significativas que ajudem a consolidar a experiência do reencontro. Perseverar no amor é assumir, com liberdade, um novo jeito de estar na Igreja: com maturidade, com protagonismo e com a consciência de que todos temos algo a oferecer e aprender.
Essa perseverança se alimenta da oração, da partilha da Palavra, da vida sacramental redescoberta e, sobretudo, da comunhão fraterna. Quando a comunidade se torna espaço de relações verdadeiras, o desejo de permanecer nela cresce. E o reencontro inicial transforma-se em missão renovada.
Inspiração para o agir cotidiano
A proposta de uma Pastoral da Re-Iniciação Cristã é um apelo à sensibilidade pastoral e à criatividade missionária. Trata-se de lançar novas redes, de sair ao encontro sem medo, de reconstruir pontes. Mas, sobretudo, trata-se de amar como Cristo amou: indo ao encontro, acolhendo sem julgar, oferecendo a todos uma nova chance de viver a fé.
Cada comunidade, por menor que seja, pode dar passos concretos nesse sentido. Começando pela escuta, pela oração intercessora, pela visita discreta, pelo convite pessoal, pelo testemunho coerente. O reencontro é sempre possível. E quando a Igreja se dispõe a acolher, o Espírito age com força surpreendente.
Por Harlei Noro | Reflexão bíblica com apoio GPT.